... ou porque uma grande corrida aos Depósitos acabará por ser inevitável.
Já aqui comentei os conhecidos (a maior parte dos economistas por esta altura faz-se desentendido, evita cair numa discussão sobre o assunto) efeitos maléficos da concessão de crédito (sem a captação prévia de poupança) por criação monetária: ciclos económicos de expansão e depressão (a começar pela Grande Depressão), a subida de preços, o efeito redistributivo a favor de emitentes (bancos) e primeiros receptores (deficits e grandes credores).
Falta comentar a própria instabilidade do sistema que no limite não escapa das leis económicas e as do comportamento racional humano, incluindo a da simples aplicação de Teoria dos Jogos (tão em voga para explicar que o mercado tem falhas e por isso necessita de regulação, quando na verdade, é possível provar o contrário, se existem falhas que não se corrigem é porque existe regulação):
1) Se os depósitos têm uma garantia formal (com um limite pré-definido) e uma outra garantia velada (a que os Bancos Centrais vão socorrer a totalidade dos depósitos como o fizeram em Agosto com um Banco inglês), os depositantes têm todas a razões para aplicar o dinheiro nos bancos com maior risco sem olhar ao seu risco.
E quando o próximo banco sofrer uma corrida aos Depósitos como é que vão poder explicar que não socorrem igualmente a totalidade dos seus Depósitos/depositantes? Não podem, especialmente em caso de “corrida” generalizada.
2) Se os bancos concedem crédito a longo prazo (ex: 30 anos no crédito à habitação) financiando-se no mercado monetário (e no caso de “veículos” especializados no papel comercial) a meses (para não falar nos próprios depósitos), e quando este mercado se recusa a renovar o crédito e aparece o Banco Central a substituir-se ao mercado e por criação monetária concede todo o crédito que este necessita (o BCE "injectou" montantes na ordem dos 200 mil milhões de Euros), porque não irá o sistema continuar a financiar-se a 30 anos com crédito de alguns meses?
Notar que os Bancos têm assim todo o incentivo para arriscar tanto quanto os seus concorrentes, quem fôr mais prudente estará a perder rentabilidade, quando depois os que mais arriscam, são socorridos até os "mercados estabilizarem".
3) E se acontece 1) e 2) isso quer dizer que o sistema monetário atingiu a perfeição e está "livre de todo o mal"?
3.1. Aparentemente parece que sim, o Banco Central tem a capacidade emitir toda a moeda que desejar para socorrer se for preciso todo o sistema bancário e todos os depósitos.
3.2. Mas não, a capacidade de todos os "incidentes" sérios serem resolvidos com criação monetária está limitado:
3.2.1. porque o aumento da quantidade de moeda diminui tendencialmente o valor da moeda para zero.
3.2.2. porque existe o receio bem fundado que sejam estabelecidos entraves (ou suspensão absoluta "temporária") ao levantamento de depósitos (inúmeros casos passados). Palavras que com 100% de probabilidade vão ser usadas: "para conter comportamentos irracionais".
Acho que é fácil perceber que outros vão perceber que os primeiros a conseguir levantar depósitos são também os primeiros a conseguir trocar o seu dinheiro por activos reais…como ouro ou até obrigações indexadas à inflação antes de todos os outros (ou seja, antes que a subida de preços se concretize) permitindo a estes (ao contrário - ou em melhores condições - dos seguintes ) protegerem-se dos efeitos de uma injecção de liquidez para garantir uma boa parte (ou o todo) do sistema: quer para ajudar os Bancos a terem "liquidez" para cumprir com os pedidos de levantamento, quer para conceder directamente crédito aos Bancos e clientes e/ou veiculos que estes suportam com garantias veladas de renovação de créditos de curto prazo.
Mas esta última razão reforça a percepção que os reguladores saberão que é preciso suspender genericamente todos os levantamentos de depósitos (a primeira das razões), mas por outro isso em si mesmo aumenta a probabilidade de uma corrida aos bancos generalizada na tentativa de levantamento antes de tal suspensão.
É o que se poderá chamar de uma self-reinforced reality.
A prova que o sistema vai sobrevivendo à custa de fugas para a frente:
- a garantia apressada de todos os depósitos quando existe um limite fixado
- o facto das "injecções" (termo de facto adequado a junkies) serem em montantes cada vez maiores e servindo-se de colateral que não apenas os de dívida pública (ou equiparado).
- Os Bancos Centrais têm arranjado formas discretas de resolver os casos pontuais que vão surgindo: incentivam e abençoam a compra ou fusão por um banco de maior dimensão. Mas o que acontecerá quando já não existirem bancos "maiores"?
Uma questão de tempo. Ou então a teoria dos jogos não serve para nada.
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